13.5.12

Caminho do Bodhisattva - Palestra





Ani Sherab Wang-mo (monja budista tibetana - Dag Shang Kagyu - Vajrayana)

 
Discursar sobre o caminho do Bodhisattva é discursar sobre o que existe de mais nobre. É o caminho que realizam todos os Budas, é o caminho da iluminação, é a essência dos ensinamentos budistas, é a essência do mahayana.

Tem vários níveis de bodhisattva:

Existe o bodhisattva que está aprendendo, que entra no caminho da liberação, da iluminação.

O bodhisattva que está nas terras dos bodhisattvas, nas dimensões da consciência (existem várias dimensões)  já é aquele que está engajado na prática espiritual.

E temos uma terceira categoria, que são as emanações dos Budas, ou seja, devido à compaixão da mente universal para o bem dos seres, se manifestam emanações de Buda, são seres que tomam um corpo de compaixão com o propósito de atuar junto com nós no caminho da liberação.

Então, temos três níveis de bodhisattva: aquele que está aprendendo, que está entrando no caminho; aquele que já está no caminho; e aqueles que já são bodhisattvas e retornam para o benefício de todos os seres.

O Bodhisattva é aquele que assume o objetivo mais amplo que possa existir, o objetivo maior que existe é o propósito de liberar todos os seres do sofrimento, é a mente madura espiritualmente e a sensibilidade de ver o sofrimento dos seres que aspira a que todos os seres se libertem deste sofrimento. Esse ó o propósito maior que empreende um Bodhisattva. O meio que ele faz para poder realizar esse propósito também é incomensurável. Ele reconhece que somente o poder da iluminação, o poder da onisciência lhe capacita para poder, dentro das particularidades de cada ser, aplicar com muita habilidade o método necessário para que se libere destas causas e condições que estão produzindo as circunstâncias mais ou menos agravantes, de maior ou menor sofrimento, então essa é a nobreza do Bodhisattva.

Aquele que empreende o caminho da liberação de todos os seres através da iluminação da sua própria mente. É um propósito muito elevado para uma pessoa que ainda não entrou dentro da prática do caminho espiritual, por isso existem vários níveis dentro do despertar do Bodhisattva de cada um. Todo praticante espiritual é um aprendiz de Bodhisattva, ele está no caminho da iluminação.
 
Então, existem dois níveis:

Um nível que é aspirar - que é quando ouvimos os ensinamentos, quando temos uma experiência interior da verdade última e essa experiência é em si mesma a plenitude, e vimos que os seres sofrem por não ter acesso a essa plenitude e buscam fora o que está dentro. Essa experiência interior que nos dá o caminho espiritual é o que matura o desejo de liberar os seres, porque eles não conseguem se liberar dos sofrimentos devido aos enganos, aos enganos que são buscados fora aquilo que tem dentro, os enganos relacionados com toda a inclusão do "eu", o egocentrismo, buscar a felicidade por si mesmo. Então a compaixão que nasce da visão espiritual ou da experiência espiritual é enorme, porque vemos que todos os seres sofrem absurdamente, então daí surge esse ímpeto ou essa coragem do Bodhisattva de liberar todos os seres, reconhece que o sofrimento em si é ilusório e por isso ele empreende esse grande propósito, que é o despertar da consciência para que possam realizar a verdade última.

Esse é o propósito do Bodhisattva e ele empreende esta senda através da iluminação da sua própria mente. Esse é o caminho que ele realiza para poder iluminar os seres. Somente um Buda, um ser completamente iluminado, uma mente que a consciência se expande até abarcar a completa onisciência, possui todo o poder para liberar os seres em cada circunstância em que se encontram.

Então o caminho do Bodhisattva é despertar a bodhichitta. Bodhichitta é o coração do despertar, é o coração "bondoso". O coração altruísta, então o Bodhisattva é aquele que tem o coração aberto e que sente cada ser e tenta aliviar o sofrimento de cada ser em cada circunstância em que ele se encontra. Isso é a bodhichitta, isso é a mente do despertar. Não existe iluminação sem bodhichitta; a iluminação é interdependente com bodhichitta, com o coração bondoso.

Podemos ser grandes meditadores, grandes filósofos, ter uma compreensão e uma experiência real e profunda da natureza de todos os fenômenos, mas não vamos lograr o que é a onisciência completa. A onisciência completa sucede quando o coração abarca todos os seres.

Por isso o caminho do Bodhisattva é o caminho da iluminação, é o caminho que percorre todos os Budas, é o caminho da completa liberação. É somente através deste coração aberto, desse desejo de fazer com que todos os seres sejam realmente felizes, com que todos os seres estejam absolutamente livres de todo tipo de sofrimento, que ele obtém a iluminação, ou que nós obteremos a iluminação.

Então para realizar este caminho, para este processo da mente do despertar que é uma maturação espiritual, existem dois tipos de bodhichitta:

Existe a bodhichitta última, a bodhichitta última absoluta é aquela que obtemos através da meditação. Na meditação, quando entramos na absorção meditativa, quando transcendemos as fixações relacionadas com a personalidade, tempo, espaço, conceitos, temos uma experiência de união, de dissolução. Esta experiência da vacuidade, ela em si vai acompanhada de compaixão e essa experiência da bodhichitta última quando experimentamos esse coração único, essa mente única, quando perdemos a diferença do que somos e nos unimos com todos os seres; essa é a bodhichitta última que se realiza através da meditação. Agora também temos a bodhichitta relativa, que é o trabalho realizado com a personalidade dentro do mundo relativo, dentro da dualidade que é onde nos encontramos: sujeito e objeto.

Então devemos começar a trabalhar com a visão pura de reconhecer que todos os seres são seres divinos. Que eu sou um ser divino, o outro é um ser divino. E começar a ter uma visão integrada. Para isso, vamos começar um treinamento do coração altruísta, vamos considerar que cada ser que encontramos é a nossa mãe, é o nosso filho único, é o nosso irmão. Vamos tentar manter uma mente equânime frente a todos os seres, assim é como vamos despertar a bodhichitta.

Este é o caminho do bodhisattva, este é o caminho da aprendizagem do bodhisattva, que é a primeira etapa, etapa primeira, relativa e de aspiração. Primeiro vamos aspirar a sermos um bodhisattva e vamos empreender a prática do treinamento que faz maturar a bodhichitta. E depois, entramos na aplicação, primeiro a mente se reforça de aspiração do desejo de realmente ser um bodhisattva para poder ajudar, beneficiar, aliviar o sofrimento dos seres e que toda a nossa atividade seja para servir os seres para que eles experimentem menos sofrimento. Compreendemos que os seres são muitos e nós somos um só. Toda felicidade que buscamos, todos os seres buscamos a felicidade, buscamos a plenitude.

Todo sofrimento e toda infelicidade vem da busca da "felicidade"; aquele que busca a felicidade por cima dos demais está sempre encontrando muitos obstáculos, está em definitivo sofrimento. Quando compreendemos que é fazendo felizes aos demais que obtemos a felicidade, e começamos a nos dar conta que os demais são muitos e que as circunstâncias para serem felizes são todas, este é o caminho do Bodhisattva: fazer felizes aos demais; assim é como somos felizes. Iluminando os demais através da sabedoria da verdade última, é como nos iluminamos. Esse é o caminho do bodhisattva, a iluminação dos seres; essa é a única verdade, a única sabedoria que realmente nos libera do sofrimento.

O Bodhisattva atua tanto a nível relativo circunstancial, dando um prato de comida, ajudando a carregar uma bolsa, servindo, ele está sempre servindo, sempre não focado no "eu", no "que eu necessito", nem no "que eu quero", senão o que é melhor para os demais. Ele não olha o "eu", ele olha a circunstância, e ele é muito sensível ao movimento das circunstâncias para saber aonde ele se situa, que vai gerar maior benefício para todos.

Quando ele se relaciona, nunca pensa "o que é melhor para mim", o que é melhor para que o outro esteja melhor, porque reconhece se o outro está bem, ele também vai estar bem, e tudo que possa gerar de bem estar é aquilo que ele vai experimentar de bem estar, isso a nível relativo.

A nível mais profundo, o bodhisattva está continuamente empreendendo atividade de dar sabedoria, de situar-se na visão da verdade, que é a interdependência, que é o estado de integração, e transmitir esta visão ali, onde ele está. Ele transmite isto através do seu movimento corporal, da modulação da sua voz, através de não utilizar a palavra de uma forma equivocada, sempre articular a palavra com sabedoria para que gere na pessoa, na circunstância, a sabedoria; transmitir, de coração a coração, a verdade última de todos os fenômenos, ou seja: a gente não pode tirar o sofrimento do outro, mas a gente pode dar as ferramentas para que o outro se libere do sofrimento. E todo esse processo sucede de uma forma muito subliminal. Não é com conceitos, é com realização, é com experiência.

Então, o Bodhisattva está sempre com a mente situada na verdade, esta mente expandida e unida. Ele é um canal, um suporte perfeito, para o bem de todos; então a sua mente sempre está expandida e unida à sabedoria universal, seu coração está sempre aberto expressando amor e compaixão. Dessa forma, toda a sua atividade é para o bem dos seres. Isto é um Bodhisattva.

Dentro deste caminho, começamos primeiro aprendendo a ser um Bodhisattva.

Como aprendemos a ser um Bodhisattva? Primeiro passo é ser boas pessoas, é a prática de ter uma mente pura, uma mente positiva com mim mesmo e com os demais. Não ver defeitos, reconhecer as qualidades, não criticar o que não compreender, como gerar uma mente, uma saúde integral e virtuosa, sempre muito positiva. Esse é o primeiro passo do caminho, da entrada do senda, da prática do Bodhisattva e isto é o despertar da bodhichitta, manter a mente num estado de equanimidade.

Depois existe o caminho da aplicação, já é quando nos engajamos numa prática espiritual, num processo de purificação, de despertar das qualidades da mente única. Então existem muitos caminhos e de acordo com a afinidade de cada um, nós vamos nos engajar num sistema gradual que nos vai levar a um despertar das nossas qualidades e nos purificar das nossas impurezas.

Então já começa o caminho da aplicação, então aí já trabalhamos com a bodhichitta de aplicação, não a bodhichitta de aspiração.

Dentro do budismo, o caminho da aplicação, basicamente se fala das seis paramitas, das seis perfeições que são: a generosidade, uma mente que dá, que dá continuamente; a ética, boa pessoa, transparente ( chacoalha a alma e só sai luz ), todos os pensamentos e propósitos é virtude; uma pessoa que mantém a mente num estado energético superior, sempre bem disposto a servir; diligência, entusiasmo; a paciência - muita paciência, infinita paciência, a paciência do Bodhisattva é a grande perfeição, é incomensurável;  a atenção e concentração, uma mente sempre presente, atenta e concentrada, para não estar distraída para que as emoções perturbadoras não dominem a sua mente, para que esteja sempre esteja neste estado virtuoso e gerando o bem para os seres. A mente deve estar atenta e concentrada. E a sexta, sabedoria, a sexta paramita, perfeição, é a sabedoria transcendental, a mente sempre com o olho da sabedoria que reconhece que tudo é vacuidade, que tudo isso não é mais que um sonho, que tudo isso é movimento de energia, interdependência, que não existe um eu separado do conjunto, tal qual experimentamos dentro da ignorância. À medida que purificamos a nossa visão e despertamos a qualidade da nossa natureza, a visão se abre e reconhecemos que estamos integrados em uma mente única, uma única consciência e que o ego, e o outro, a personalidade não é mais que um instrumento para que possamos reconhecer essa natureza última a qual todos pertencemos e na qual todos estamos unidos. Isto se chama onisciência, a consciência particular é o reflexo da onisciência e é através do relativo que chegamos ao absoluto. É através da investigação do que é a nossa consciência, no sentido de lucidez, no sentido de claridade que reconhecemos a onisciência. Então isto é a sabedoria, isto é o olho das perfeições.

São seis as práticas do bodhisattva, são as seis perfeições. As cinco primeiras são cegas, a sexta é o olho da sabedoria, é a sabedoria que reconhece a vacuidade, que reconhece a vacuidade de existência separada do conjunto. Não a vacuidade como vácuo, senão que não existe nada por si mesmo. Tudo é interdependente: uma coisa depende da outra, depende da outra, depende da outra... Não existe nada de realidade por si mesma. Então a existência é como se fosse um complexo muito estruturado de causas e condições, que se interdependem, dando fatores coemergentes, em contínuo movimento e transformação. As montanhas, os universos, os corpos e os seres. Não existe um instante que esteja parada a existência e não existe um átomo de solidez. Tudo é um contínuo movimento de energia, isto é o olho da sabedoria. Esta é a visão profunda na qual a mente do Bodhisattva descansa enquanto pratica as cinco perfeições: generosidade, ética, diligência, paciência, concentração-atenção. Este é o conjunto geral da prática dos filhos do vitorioso, da prática dos Bodhisattvas.

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